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Em direção à unidade humana
.“Um novo espírito de
unicidade tomará posse da raça humana...”
Em direção à unidade?
Vasudhaiva kudumbakam, disseram os antigos indianos: o mundo é uma família.
O ideal da unidade humana, que já estava
presente no alvorecer da civilização, nunca pareceu tão perto da realização,
mas paradoxalmente o quanto mais próximo chegamos dela, mais parecemos nos
iludir. É como se no início do século XXI a necessidade por uma unidade humana
nunca tivesse sido tão grande, e ainda assim muito frequentemente essa mesma
unidade, vista como inevitável, é percebida como um tanto ameaçadora.
Mundo em crise
Nós falamos de mundialização, de globalização,
e no mesmo fôlego nós lamentamos os perigos da uniformidade. Nós falamos de
democracia como um ideal universal e do progresso de todas as nações rumo a ela
como irreversível, e ainda assim, ao mesmo tempo, esse modelo democrático é
percebido como um sistema imposto por algumas nações em outras. Nós estamos
encarando problemas ambientais que ameaçam a própria sobrevivência do nosso
planeta. Nós estamos conscientes do ‘aquecimento global’ e de uma diminuição
dos recursos finitos do planeta, e sabemos que a fim de resolver esses
problemas comuns o Estado-nação individual já não é mais uma instituição
adequada. Porém, o próprio conceito de um organismo supranacional é percebido
como uma possível violação à soberania do Estado-nação, conquistada em
numerosos casos depois de muitas décadas – ou mais – de luta e dor.
O apagar de culturas
Nós alegamos que o mundo de hoje é uma aldeia
global, porque o progresso tecnológico tornou a nossa Terra muito pequena, e as
notícias podem instantaneamente alcançar todos os habitantes da Terra por meio
de autoestradas da informação. Porém, existe o medo de que essa cultura da
aldeia global possa apagar as diversas culturas da Terra; de fato é argumentado
que já há um imenso direcionamento para a uniformidade dos hábitos de vida e
para a uniformidade do conhecimento.
Fronte econômico
No fronte econômico, o muito falado processo de
liberalização é visto por muitos como uma tentativa de impor a todos um único
modelo adequado para alguns países, e para espalhar a todos uma cultura de
consumismo. Um computador para cada um e pão para apenas um quarto da população
mundial; é essa a meta para a qual estamos avançando?
Ciência
No século XIX, intelectuais viram o progresso
da ciência como o grande fator que poderia guiar rumo à unificação da
humanidade, uma vez que a ciência era algo comum a todos os homens em suas
conclusões e era internacional em sua própria natureza; mas, nós sabemos agora
que a ciência pode ser mal usada, e está sendo mal mal usada, para descobrir
mais e mais meios de destruição. Nós temos perdido a fé na ciência como uma
panaceia para todas as maldades, mas o que há no lugar para substituí-la?
O maior obstáculo
Nós sabemos que o egoísmo é o maior obstáculo
para uma vida de harmonia e paz na Terra, mas após tantos séculos de civilização
nenhum montante de pregações religiosas ou ensinamentos morais têm sido capazes
de convencer o ego a renunciar suas reivindicações, assim como falar a ele de
fraternidade é falar a ele de algo fundamentalmente contrário à sua natureza.
Necessidade de uma real unidade
Assim sendo, parece que embora nós estejamos
nos movendo um tanto relutantemente em direção a um tipo de unificação, esse não
é um processo provável para resolver os muitos problemas agudos da Terra, nem a
prevista unidade irá responder as necessidades mais profundas e aspirações do
ser humano. Na verdade, nós temos começado a entender que se nós queremos
preservar a liberdade para o homem se desenvolver e crescer em toda liberdade,
essa unidade não pode ser construída através de meios mecânicos. Não pode ser
alcançada desde que o homem não reconheça a unidade real entre homem e homem; não
se pode chegar a ela por meio de dispositivos sociais e mecânicos; e nós apenas
temos começado a perceber que se o objetivo dela não for trazer uma vida mais
justa, mais brilhante e mais nobre para toda a humanidade, essa unidade
dificilmente é desejável.
O homem será superado
Portanto, torna-se urgente entender o que é essa unidade em relação à qual nos sentimos impulsionados, apesar de nós
mesmos. O homem é um ser transitório, disse Sri Aurobindo brevemente após a Guerra Mundial, a evolução
continua e o homem será superado. Não apenas Sri Aurobindo anteviu o próximo
passo na evolução do homem, mas nos contou como participar dela: em vez de
permanecer como um espectador passivo em um processo doloroso e incompreensível,
nós poderíamos conscientemente colaborar em nossa própria evolução e nos
libertarmos de nossas aparentemente inextricáveis amarras.
Usando os meios internos
Porém, para isso nós temos que reverter o
processo, disse Sri Aurobindo, e em vez de usar meios externos, devemos nos
voltar para o nosso interior, porque sem uma mudança na natureza do homem
nenhuma mudança real nas circunstâncias externas é provável que aconteça. A única
maneira que nós podemos nos mover em direção à unidade é progressivamente
perceber que há um Espírito secreto, uma Realidade divina na qual somos todos
um – não apenas percebê-la mentalmente, mas descobrir em nós mesmos e viver
esse conhecimento. O segredo da unidade está dentro de nós, disse Sri
Aurobindo; o segredo da irmandade está dentro. Não há unidade, exceto pela
alma; não há verdadeira irmandade, exceto na alma e pela alma. Apenas quando
vivermos da
alma e não do ego a verdadeira unidade reinará na Terra.
Conectando com a nova conscienciosidade
Essa ‘era espiritual da humanidade’ representará então uma transformação na natureza do homem tão significativa quanto o aparecimento da mente pensante na Terra. Do mesmo modo como por milênios a mente foi o centro da nossa vida, então, na nova era que se abre para a humanidade, ou era ‘supramental’, a alma se tornará o centro de toda a vida e das atividades. Um novo estágio na evolução do homem já teve início; uma nova conscienciosidade, maior do que a mente, uma conscienciosidade da verdade, como Sri Aurobindo disse, na qual as dualidades, hesitações e limitações da mente e a ganância e a cegueira do ego não mais existirão, já começou a aparecer, e todas perturbações e convulsões que existem no presente, tão dolorosamente rasgando a nossa Terra, são os sinais externos dessa crise evolucionária. Essa nova conscienciosidade já está trabalhando na atmosfera da Terra: podemos nos conectar com ela, podemos chamá-la em nós mesmos, podemos usá-la para transformar nossa natureza inteira e consequentemente o mundo no qual vivemos.
É neste sentido vasto e de longo alcance que
Auroville está dedicada à unidade humana. Todos estão convidados.
(Portuguese translation by Pablo Antunes)